PAPA DÁ NAS ORELHAS AOS BISPOS
O Papa não esteve com rodeios no encontro que teve ontem com os bispos portugueses: “É preciso mudar o estilo de organização da comunidade eclesial portuguesa e a mentalidade dos seus membros”. Por outras palavras, Bento XVI disse aos prelados que o clero português tem de ser mais eficaz na sua organização e na resposta aos anseios das comunidades, por forma a conseguir travar a perda de fiéis e a diminuição constante das vocações.
“Só com um novo estilo de organização e com outra mentalidade, Portugal pode ter uma Igreja ao ritmo do Concílio Vaticano II, na qual esteja bem estabelecida a função do clero e do laicado”, disse o Santo Padre, num discurso carregado de citações bíblicas, colocando Cristo no centro de tudo, mas concreto nos reparos à Igreja Portuguesa, que já há oito anos não prestava contas em Roma.
Os bispos portugueses, que preferem falar de “preocupação partilhada” em vez de repreensão do Papa, assumem que “o actual momento da Igreja portuguesa não é o melhor” e ficaram com a consciência plena de que o Sumo Pontífice leu os relatórios e está bem informado do que se passa em Portugal.
Aliás, nas audiências aos bispos de cada diocese, Bento XVI focou questões concretas, falando, por exemplo, das celebrações em santuários aos titulares das dioceses de Leiria e Braga, das questões universitárias aos de Lisboa e Porto e das áreas sociais e da família aos de Setúbal, Évora e Beja.
“Sabemos que o Santo Padre está preocupado, mas a preocupação também é a nossa, ou seja, a de sermos mais eficazes, não no sentido do marketing, porque a Igreja não vai por aí, mas no sentido de correspondermos de forma mais eficaz aos anseios espirituais das pessoas”, disse ao CM D. Carlos Azevedo, no final do encontro com o Papa.
Um encontro no qual Bento XVI falou claro e deu pistas concretas, dizendo aos bispos que, para evitar a perda de fiéis e, sobretudo, o aumento do número de não praticantes, o melhor é rever a catequese dos primeiros anos e a forma como é ministrada. “À vista da maré crescente de cristãos não praticantes nas vossas dioceses, talvez valha a pena verificardes a eficácia dos percursos de iniciação actuais”, disse o Papa, acrescentando que é necessário que, “na vida da Igreja”, os padres se ocupem cada vez mais das coisas de Deus e os leigos das coisas dos homens.
Recorrendo aos resultados do Grande Jubileu do ano 2000, o Papa aludiu a uma certa falta de eficácia pastoral, referindo que “a confissão mais frequente nos lábios dos cristãos foi falta de participação na vida comunitária”.Para o porta-voz da Conferência Episcopal, D. Carlos Azevedo, “todo o clero, bispos e padres, têm de levar a sério as palavras avisadas do Papa”.
PADRES COM MEDO DOS LEIGOS
Pôr os padres a fazer apenas o que lhes pertence e entregar aos leigos boa parte da actividade paroquial e das comunidades, foi uma das mais concretas recomendações do Papa aos bispos portugueses. Ideia com a qual todos parecem concordar, mas que ainda assusta muitos padres em Portugal. D. Jorge Ortiga, presidente da Conferência Episcopal (CEP) disse ao CM que “ainda há muitos padres com medo dos leigos”, situação que “é necessário combater”.
D. Carlos Azevedo, porta-voz da CEP, diz que “não se compreende que um padre ande preocupado com a construção de lares ou centros de dia, porque essa tarefa pode e deve ser levada a cabo por leigos. O padre deve preocupar-se com a qualidade das celebrações, da catequese e da evangelização”.
SAIBA MAIS
37 bispos estiveram esta semana em Roma na visita Sacra Limina, que os prelados realizam ao Vaticano, por norma, de cinco em cinco anos.
Portugal tem nesta altura 41 prelados, sendo que 21 são titulares (os das 20 dioceses e o das Forças Armadas) e 20 são eméritos.
Destes, 17 marcaram presença na visita a Roma.
CÂNTICOS
D. Carlos Azevedo, secretário da CEP, diz que “era fundamental que existisse um livro de cânticos litúrgicos a nível nacional”.
FÁTIMA
No discurso de ontem, o Papa não esqueceu Fátima, dizendo que é como “uma escola de fé” em que os bispos devem sentar-se como “humildes alunos que precisam de aprender a lição”.
CONVITE
Bento XVI não foi formalmente convidado a visitar Portugal, porque “este não era o momento”.
Secundino Cunha, Enviado especial Vaticano
CM
Secundino Cunha, Enviado especial Vaticano
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